“Treino é treino, jogo é jogo”
Ao longo da última semana, as cinco agremiações que compõem o Grupo Especial B do carnaval capixaba (Tradição Serrana, Barreiros, Pega no Samba, Imperatriz do Forte e São Torquato), realizaram seus ensaios técnicos no Sambão do Povo a fim de se aprimorarem para o desfile oficial que vai ocorrer no dia 06 de Fevereiro. Ensaios que são primordiais tanto para as agremiações – para que possam perceber em conjunto como se porta seus principais quesitos no palco principal do carnaval –, como também para o público, que tem a oportunidade de se aproximar das escolas de samba e entrar no clima dos desfiles que se aproximam.
E atuando como um “analista” das agremiações durante os ensaios técnicos, posso afirmar que a Pega no Samba e a Imperatriz do Forte realizaram os melhores ensaios do Grupo Especial B, e se confirmam como “favoritas” ao titulo do carnaval 2015. Claro que essa foi apenas a impressão passada pelo ensaio técnico, uma vez que importantes quesitos como harmonia, evolução, conjunto, alegorias e fantasias, só vão ser conhecidas em sua totalidade no desfile oficial.
Veja, abaixo, minha análise das agremiações durante o ensaio técnico:
Tradição Serrana - Fiquei feliz com os esforços da direção da agremiação em realizar o ensaio técnico com o maior número possível de componentes e quesitos, mesmo sabendo das enormes dificuldades que sempre cercam a Tradição Serrana (e entre elas está a distância entre a Serra e o sambódromo capixaba). Tecnicamente “deficiente”, o ensaio técnico da agremiação é inferior ao do restante do Grupo B, entretanto, pude perceber “nuances” de uma “verdadeira” escola de samba, algo que espero encontrar no desfile oficial. Também achei preocupante a apresentação de sua comissão de frente, que expôs uma coreografia “ingênua” e que pouco se percebe sua ligação com o enredo. Já bateria da Tradição Serrana, que é comandada por Alcino Junior e Jorginho, é um grande exemplo dos esforços da agremiação em “colocar” o seu carnaval na avenida, sendo uma verdadeira união de mestres e ritmistas, que resultou em uma apresentação “crescente”, e que alcançou o seu melhor momento após a saída do segundo recuo.
O Samba – Apesar de a Tradição Serrana possuir um dos melhores enredos do carnaval 2015,e que faz uma justa homenagem as emissoras de rádio e aos radialistas do Espírito Santo, o samba da escola acabou deixando a desejar. A obra é excessivamente “marcheada” e carece de criatividade melódica e em sua letra, se limitando a citar emissoras de rádio e “partes do enredo” sem a devida preocupação em “criar” um samba diferenciado, como deveria ser, mas não é.
Barreiros – Se apresentando com um reduzido número de componentes, a Unidos de Barreiros pouco se “expôs” em seu ensaio técnico. A sua comissão de frente não apresentou toda sua coreografia (deve estar guardando “surpresas” para o desfile oficial), e o seu primeiro casal (Diego e Nívia) também fez a mesma opção. O maior destaque ficou por conta da apresentação da bateria do mestre Reginaldo, que demonstrou toda sua ousadia realizando várias e criativas bossas. O único grande problema enfrentado pela agremiação ocorreu durante a entrada da bateria no segundo recuo, pois em razão de um problema de comunicação, bateria e carro de som ficaram em desencontro harmônico, ocasionando o fatídico “atravessamento” do samba, que logo foi resolvido.
O Samba – Homenageando o município de Cariacica, o samba da Unidos de Barreiros conseguiu fugir da “mesmice” e se apresenta com um empolgante refrão principal e alguns trechos realmente criativos (principalmente em letra). E considero o samba da agremiação extremamente funcional e competente, podendo conseguir tanto interagir com o público quanto brigar por boas notas dos julgadores no desfile oficial.
Pega no Samba – Mesmo sem a presença do seu intérprete oficial Bruno Ribas (devido a compromissos com a Mocidade de Padre Miguel, escola que defende no Rio de Janeiro), fato que acabou decepcionando alguns que foram até o Sambão do Povo, a Pega no Samba realizou um ensaio técnico louvável. E um dos grandes méritos da escola foi se apresentar com um bom número de componentes e de forma muito organizada, mas infelizmente, a maior parte desses componentes pouco cantava o samba (principalmente os “quesitos” da agremiação, que ou não cantavam ou cantavam pouco, vide comissão de frente, mestre sala e porta bandeira e bateria).
Sem dúvidas, a Pega no Samba demonstrou toda a sua força para brigar seriamente pelo titulo do Grupo Especial B e ainda demonstrou toda a qualidade de algum de seus principais quesitos: uma comissão de frente muito bem coreografada sob os comandos do também carnavalesco Paulo Balbino, uma bateria afinadíssima (do sempre competente Mestre Jorginho), e também um carro de som poderoso, fato que realmente me surpreendeu.
O Samba – Apontado por alguns como um dos melhores sambas do ano, particularmente, não considero o samba tudo isso. Acho o samba da agremiação um “bom samba”, de ótimo andamento e que possivelmente deve funcionar na avenida, assim como ocorreu no ensaio técnico. E mesmo sendo uma obra robusta e de boa letra, ainda falta ao samba um algo a mais, e eu diria que esse “algo a mais” seja um pouco de criatividade melódica.
Imperatriz do Forte – Realizando um ensaio técnico extremamente organizado, a Imperatriz do Forte novamente demonstrou que é uma das principais forças do carnaval capixaba e figura entre as favoritas ao titulo do grupo especial B. E o maior destaque da agremiação ficou por conta da atuação do carro de som comandado por Wander Show e também a atuação quase irretocável da bateria do Mestre Renatinho, uma bateria repleta de qualidades, ousadia e muito “peso”. Um dos pontos preocupantes é que a escola cantou pouco e durante o ensaio para a entrada do recuo da bateria acabou errando, fato normal em um ensaio, disso eu não tenho dúvidas, mas o que me preocupa é que logo atrás da bateria e do carro de som, vem três alas que são julgadas e analisadas por seu desenvolvimento: ala de passistas (que é a primeira a cobrir o vácuo deixado pela bateria), o casal de mestre sala e porta bandeira (que tem que bailar ao mesmo tempo em que corre para suprir o espaçamento) e uma ala de passo marcado, que por alguns estantes deve deixar de seguir a sua coreografia para também fazer parte do “tampão” harmônico de um dos momentos chave de um desfile de escola de samba, a entrada no recuo da bateria. Não seria arriscar demais colocar esses três segmentos para “cobrir” a bateria? Em minha opinião é um risco desnecessário.
O Samba – A Imperatriz do Forte vai levar para a avenida em 2015 um fértil enredo sobre a FAMES (Faculdade de Música do Espírito Santo) e a história da música ao longo da história. E para isso, a agremiação escolheu um samba de letra quase irretocável e refinada melodia, sendo definitivamente o melhor samba do grupo B. O meu único receio é em relação à sua “extensão” e a cadenciada melodia de sua segunda parte, que na avenida, pode se revelar uma “obra arrastada”. Chamo atenção para a excepcional passagem “O congo é nosso som/ na Faculdade aprimoramos nosso Dom”, que realmente exala qualidades.
São Torquato – Também realizando um bom ensaio técnico, mesmo que com um número reduzido de componentes, a São Torquato demonstrou que pode “entrar na briga” e tentar surpreender as demais agremiações do Grupo B. Achei impressionante a energia dos componentes da escola, assim como o encaixe quase perfeito entre o carro de som comandado por Marcinho Diola (e que teve a grande capacidade de construir uma equipe), e a competente bateria do mestre Renato, ambos muito a vontade com o bom samba da agremiação. Já em relação à comissão de frente da São Torquato, ficou nítido a falta de ensaio dos seus componentes. Outra aposta da agremiação para o carnaval 2015 é na experiência do casal de mestre sala e porta bandeira Kira e Renatinha.
O Samba – Com um enredo que narra às raízes africanas no Brasil, a São Torquato optou por um samba curto, funcional, de ótimo andamento e letra quase que irretocável (mesmo que escorregue algumas vezes para a “pieguice”). E também acredito que o samba possua um andamento perfeito para a voz e estilo de Marcinho Diola, interprete oficial da agremiação e também um dos compositores do “bravo” samba.
Gustavo Fernando.
* O Colunista Gustavo Fernando é estudante de Comunicação Social, sambista, comentarista de carnaval da Rádio ES AM, compositor e pesquisador de Carnaval.
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